Pesquisa confirma efetividade de programas de parentalidade positiva via plataforma digital 

Quando falamos de cuidados na primeira infância, será que fornecer informações para incentivar a parentalidade positiva entre os cuidadores pode realmente contribuir para melhorar as práticas no dia a dia? E o uso de tecnologias para essa finalidade, especialmente entre famílias em situação de vulnerabilidade social, é eficaz? Essas são questões que nossa equipe na United Way Brasil tem considerado ao longo da execução do programa Crescer Aprendendo, que há mais de dez anos apoia o desenvolvimento integral na primeira infância, oferecendo conhecimento a cuidadores e educadores.

Embora nossa percepção seja positiva, avaliamos continuamente os resultados e buscamos maneiras de aprimorar nossas ações com base em fatos e dados. Um artigo científico recém-publicado é mais uma ferramenta de auxílio nessas reflexões. Baseado em uma pesquisa, ele reforça nossas impressões e traz novas perspectivas sobre os impactos do Crescer Aprendendo nas famílias.

Assinado pela psicóloga com doutorado e pós-doutorado em Saúde Mental na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP-USP) Elisa Rachel Pisani Altafim, docente e orientadora do Programa de Pós-Graduação em Saúde Mental da FMRP-USP, o artigo “Digital Parenting Program: Enhancing Parenting and Reducing Child Behavior Problems” (“Programa de Parentalidade Digital: Melhorando a Parentalidade e Reduzindo Problemas de Comportamento Infantil”) se baseia em uma pesquisa feita com cuidadores que participaram do programa da UWB ao longo de 2023. Os resultados apontaram redução de práticas coercitivas pelos cuidadores, aumento da satisfação com o papel de parentalidade e melhoria do comportamento das crianças.

A pesquisa entrevistou 91 cuidadores de crianças de 2 a 6 anos em três ondas de entrevistas: antes do início do programa, ao final das atividades e cinco meses após o encerramento. No estudo, a autora destaca que “práticas parentais negativas, como palmadas e agressão verbal, são fatores de alto risco para o desenvolvimento infantil, incluindo o aprendizado acadêmico. Portanto, apoiar pais e cuidadores na compreensão da importância da disciplina positiva e não violenta é crucial para prevenir a violência contra crianças, promover interações positivas e fortalecer os laços entre crianças e cuidadores”.

A pesquisa mediu os resultados utilizando a ANOVA, uma análise de variação que parte de hipóteses e as testa em diferentes momentos com a mesma amostra. A pesquisa foi aplicada antes do início da participação no programa (fase 1), logo após o encerramento (fase 2) e fez um acompanhamento cinco meses após a finalização (fase 3). No caso das práticas coercitivas, houve uma diminuição do período pré para pós-intervenção (passando de 3,70 para 3,20) com manutenção no acompanhamento (3,23). A satisfação com o papel de parentalidade se manteve estável nas fases 1 e 2, mas aumentou na fase 3 (1 = 24,27; 2 = 24,44; 3 = 26,97). Já os problemas de comportamento de conduta infantil diminuíram significativamente da fase 1 para a fase 3 (1 = 3,52; 2 =  3,03; 3 =2,87). 

Outro resultado importante para nós foi a boa aceitação dos conteúdos compartilhados com as famílias. A maioria dos participantes da pesquisa considerou as informações “muito interessantes” e se engajou com as estratégias propostas pelo programa. Os temas que tiveram maior percentual de respondentes considerando os conteúdos “muito interessantes” foram violência contra crianças (82,4%), alimentação saudável (79,1%) e relações étnico-raciais e racismo (73,6%). 

Este resultado reforça a efetividade da estratégia adotada atualmente pelo Crescer Aprendendo. Em 2020, devido à pandemia de Covid-19, a metodologia foi adaptada para um modelo virtual utilizando a plataforma WhatsApp. O objetivo era compartilhar com as famílias conteúdos de apoio ao desenvolvimento infantil, fornecer suporte emocional e fortalecer a rede de apoio entre os participantes. A partir de 2022, com o retorno às atividades presenciais, adotamos um modelo híbrido, com dois encontros presenciais opcionais para as famílias e o envio diário de mensagens via WhatsApp. 

São divulgados vídeos, áudios e textos sobre os seguintes temas: direitos das crianças, o papel da família, saúde física e mental das crianças, alimentação saudável, comportamento infantil, a importância do brincar, violência contra crianças e mulheres e geração de renda. Uma característica do programa que contribui para a sua efetividade é o fato de a troca digital por meio de grupos contar com um mediador treinado, que estimula as interações, e um psicólogo, que dá suporte individualizado a famílias com necessidades complexas e as encaminha para atendimento quando necessário.

O estudo também indicou pontos de melhoria e possíveis ações complementares que podemos incorporar ao programa. Mais de um terço dos praticantes respondeu não fazer ou raramente se envolver nas atividades sugeridas com seus filhos, o que aponta a necessidade de buscar maneiras e ampliar o envolvimento dos cuidadores nessas atividades. 

A maioria dos participantes da pesquisa relatou já ter passado por situações de insegurança alimentar (78%) e ter participado de programas de transferência de renda (64%). Isso reforça a importância da distribuição de cestas básicas às famílias feitas pela UWB três vezes durante a participação no Crescer Aprendendo, mas fortalece a necessidade de aproximar o programa de políticas públicas de apoio e transferência de renda, já que a falta de recursos essenciais afeta a parentalidade em grande medida.

Confirmar a efetividade do uso de aplicativos móveis para disseminar a parentalidade positiva nos mostra que o Crescer Aprendendo dá uma contribuição para o desenvolvimento integral e saudável na primeira infância. Temos muito a comemorar com essa pesquisa, mas também temos desafios importantes, em busca de dar escala e aprimorar o programa.

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