Metodologia do impacto coletivo: uma estratégia para a colaboração que gera resultados

Na terceira matéria sobre o Fórum Brasileiro de Impacto Coletivo vamos saber como surgiu esse conceito por meio da entrevista inédita com um dos “pais” da metodologia, John Kania. O Fórum foi realizado pela United Way Brasil em aliança estratégica com Collective Impact Fórum, Aspen Institute, Global Opportunity Youth Network (GOYN) e Gife (Grupo de Institutos Fundações e Empresas), com apoio de disseminação de conhecimento do Instituto Sabin e cooperação da FEMSA e OIE.

Na segunda parte do evento, no dia 29, o jornalista Fernando Rossetti entrevistou John Kania, fundador e diretor-executivo do Collective Change Lab. John é pesquisador, escritor e palestrante sobre temas que discutem como as organizações e as pessoas têm empreendido mudanças nas diferentes realidades, nos últimos 30 anos, sendo considerado um dos criadores do conceito de impacto coletivo. 

Tudo começou em 2011, quando ele atuava na FSG e estava trabalhando com diferentes organizações, individualmente. “Todas tinham missões incríveis e queriam mudar o mundo, o que é ótimo, mas ficava claro que nenhuma delas conseguiria atingir suas metas isoladamente. Então, demos alguns passos para trás e começamos uma pesquisa para obter insights e pensar em como reunir instituições de setores diferentes para obter avanços positivos em maior escala”, explicou John, em resposta à pergunta de Fernando, sobre como a metodologia foi desenvolvida.

O resultado dessa pesquisa trouxe a confirmação de que a colaboração entre as organizações era mínima. Com base no pouco que existia, fizeram uma análise mais aprofundada e chegaram a cinco condições básicas para que a atuação coletiva aconteça e gere impacto: ter uma agenda comum (definição do problema e o que se quer fazer para enfrentá-lo); indicadores compartilhados (organizações que atuam com a mesma causa deveriam usar o mesmo escopo de indicadores para entender avanços e desafios comuns); ações que se reforçam (integrar as atividades que as instituições realizam); comunicação contínua (um diálogo permanente entre as organizações que estão atuando juntas); ter uma organização de base (responsável em coordenar todo o processo e os envolvidos nessa operação coletiva).

Assista ao painel de John Kania e Fernando Rossetti abaixo:


Impacto coletivo é para problemas complexos e exige mudança de cultura

Para John, existem três tipos de desafios: simples, complicados e complexos. O impacto coletivo se aplica aos complexos que, na nossa realidade, estão relacionados a questões sobre as quais não sabemos tudo, que envolvem muitas pessoas, situações e instituições, como é o caso de vacinar toda a população contra a Covid-19, por exemplo. 

“Para mudar um sistema e torná-lo eficiente, é preciso trazê-lo para a sala”, explicou John. “É necessário envolver todos os players que fazem esse sistema acontecer, porque essas pessoas e instituições precisam trabalhar juntas e eu acredito que a essência do impacto coletivo está nos relacionamentos. Acredito que se quisermos mudar sistemas, precisamos mudar as pessoas, ou seja, os esforços de impacto coletivo estão relacionados à mudança de cultura, que é feita por pessoas. Estas vêm e vão, mas a cultura fica. E se ela for frágil, as transformações não se sustentam”, reforçou. Ou seja, mudar o sistema pressupõe mudar as condições que o criaram e que o mantêm dessa forma, ineficiente.

John acredita que as responsabilidades devem ser distribuídas quando se trata de atuar em colaboração para gerar impacto coletivo. Nunca se deve depender de um líder, mas a cooperação como base, porque não é um modo hierarquizado de se fazer as coisas. “Tem um papel, na metodologia, que é o líder do sistema, que coletiva a liderança sistêmica, cujo papel é nutrir e apoiar a mudança, ao invés de ‘puxá-la’”, definiu o especialista. “Diferentes especialistas se juntam para pensar em soluções para um problema específico”, reforçou.

Soluções de e para longo prazo

Dentre as perguntas trazidas pelo público do evento, uma mereceu destaque nessa conversa: “Qual o tempo necessário para uma ação de impacto coletivo acabar e se cumprir?”. John foi cirúrgico na sua resposta: “Problemas complexos são questões de gerações inteiras. A pobreza, por exemplo, é geracional e, provavelmente, vai existir por muito tempo, mas que, se percebida como essencial, tende a se enfraquecer com o tempo, diante das ações coletivas e coordenadas”. Mas ele também aconselha: “Se não se obtém progressos com determinada questão, em dois ou três anos, provavelmente é algo que não vale a pena continuar. Para se obter sucesso, é preciso que sejam percebidas mudanças sistêmicas.”

Com relação aos investimentos necessários para sustentar iniciativas de impacto coletivo, John acredita que organizações e empresas com fins filantrópicos podem manter a espinha dorsal da ação (uma organização que protagonize a articulação da colaboração, por exemplo), mas também podem ter um papel importante no corpo da liderança, “normalmente um comitê consultivo que seja multissetorial”, recomendou.


DURANTE TODO FÓRUM BRASILEIRO DE IMPACTO COLABORATIVO, OS PARTICIPANTES FORAM CONVIDADOS A COLABORAR E COMPARTILHAR SUAS REFLEXÕES SOBRE OS TEMAS ABORDADOS NOS PAINÉIS. DURANTE A EXPLANAÇÃO DE JOHN KANIA, EM ENTREVISTA AO FERNANDO ROSSETTI, ESTAS FORAM AS PRINCIPAIS EXPRESSÕES REGISTRADAS NO JAMBOARD
  • “As surpresas e os imprevistos fazem parte do processo”
  • “O impacto coletivo acontece a partir de soluções integradas, que precisam ser comunicadas e alinhadas entre as organizações envolvidas”
  • “Uma agenda comum exige um trabalho em conjunto se quer, de fato, gerar impacto sustentável”
  • “Se ocorrem mudanças, as soluções vão emergir”
  • “A essência do impacto coletivo tem a ver com os relacionamentos”
  • “A oportunidade de colaboração é uma forma estrutural e o caminho para o futuro”
  • “Para as empresas se engajarem, as causas têm de ser cruciais para os negócios”
  • “A gestão do conhecimento ajuda a construir o tecido e fortalecer o processo”
  • “Importante que os participantes entendam os progressos, vejam sentido e queiram continuar. São processos longos, mas com ganhos reais”

Na próxima matéria, confira o impacto coletivo na prática, por meio de experiências compartilhadas por Liz Weaver, co-CEO do Tamarack Institute, Paulina Klein, do Impacto Coletivo para Pesca e Aquicultura do México, Amy Ahrens Terpstra, vice-presidente de parcerias de impacto coletivo da United Way Salt Lake, mediadas por Jennifer Splansky Juster, diretora executiva do Collective Impact Forum da FSG.

Quer assistir ao Fórum na íntegra?